Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

15 agosto 2007

Liguem o campo de força para os homens de sucesso

- Jr, bom dia!

- Fala Celsão! Cadê a Bicicleta?

- Estourou a corrente e estou sem grana para concertá-la. Esse lance de grana está russo; está espremendo cada vez mais! Passei aqui para te fazer uma pergunta, você precisa me ajudar!

- Se estiver ao meu alcance, tudo bem!

- A pergunta até que é fácil, difícil está sendo achar respostas para ela!

- Diga lá!

- Como viver neste mundo sem corromper e sem se permitir ser corrompido? Como viver neste mundo de falsos valores sem corromper os próprios valores?

- Caracas! Não podia pegar mais leve logo cedo?

- Cara, estive pensando e não vi nenhuma solução para isso! Tenho visto que a estrutura social se baseia inteiramente na hipocrisia. Tudo que eles aí fora chamam de moral, não tem nenhuma relação com a verdadeira moral: é puro jogo de interesses e hipocrisia. Tudo! Tudo que está aí fora é formado através da hipocrisia, mentira e rolo. Por isso que fica difícil tirar os valores necessários para o próprio sustento, o que não tem nada a ver com essa idéia medíocre de ter que "vencer na vida". Tenho visto que para ser um bom vendedor, tenho que ter o talento para a mentira e para iludir. Quer ganhar dinheiro? Então, minta e venda ilusão. Invente um modo de fazer o outro acreditar que as necessidades desnecessárias são necessárias, e pronto: você será um homem de sucesso!... Você quer ganhar dinheiro: então, prepare-se, você vai precisar saber mentir e mentir muito bem, pois o mercado está cheio PHD'S em mentirologia. Para todos os lados que eu olho, vejo que para você vender, você tem que se vender e participar de uma espécie de jogo socialmente aceito: eu minto para você e você finge que acreditou e, desse modo, vamos intercalando os papéis...

- Você é fogo!

- Cara! Sério! Já vi isso aqui mesmo com você em ação.

- Como assim?

- Outro dia mesmo vi o quanto que você é péssimo mentiroso... Ficou jogando um monte de xaveco para aquela gordinha levar a bata de modinha que, a meu ver, ficou horrível que só! A mulher ficou mais gorda ainda e você dizendo para ela que tinha ficado uma beleza... Olhe bem por você mesmo, não acredite em mim! Tudo que está voltado no comercial está alicerçado na hipocrisia. Para você entrar nesse sistema, para você sobreviver no meio dele, para você conseguir tirar alguma coisa dele, você tem que saber mentir, você tem que ser hipócrita, se não, é fracasso na certa... O sistema te engole! Se quiser vencer, vendas os seus valores... A própria palavra "venda" já diz a necessidade de "vendar" os próprios valores. Se quiser, em algum momento da relação comercial, você terá que ser hipócrita, fazer caras e bocas, expressar um sorrizinho amarelo, meter uma máscara e tudo bem. Não tem outro jeito! Isso é socialmente aceito... As pessoas até dizem que se você quiser manter uma empresa de modo certinho, você acaba quebrando. Todo mundo sabe disso e participa do mesmo jogo que acaba criando sempre tensão, conflito e corrupção. O pior é que a gente que vê e não quer participar disso, acaba sempre sendo tirado como uma pessoa problema, alguém que ainda não conseguiu achar seu lugar na sociedade, alguém que não dá certo em nada e por ai vai... Já ouvi tanta coisa que você não faz nem idéia...

- E você pensa que comigo as coisas são diferentes, Celsão?

- Creio que não!

- Eu também tenho que mentir, contar histórias, ouvir conversas que não tem nada de nutritivo, papinhos altamente furados, fazer o jogo de algumas madames vazias, que afogam suas tristezas e frustrações em roupas, perfumes e bijuterias. Tenho que omitir o que realmente penso e sinto, tenho que ludibriar para poder conseguir alguns poucos trocados para poder arcar com o meu já bastante simplificado custo de vida. Quer queira, quer não queira, temos que jogar esse jogo. O senhorio do prédio não quer saber se eu estou buscando um modo de vida calcado em valores sólidos; no dia do aluguel, o valor tem que estar lá. As cias de água, luz e telefone também não, muito menos o dono do mercado aqui do bairro. Todos participamos desse mesmo joguinho nojento.

- Cara, como dói ter que silenciar essa voz que fala baixinho aqui dentro de mim, para poder dar ouvidos a essa voz das exigências sociais. Não é fácil; isso gera um desgaste de energia descomunal. Chego em casa totalmente acabado.

- Celsão, por várias vezes fui obrigado a ser hipócrita comigo mesmo, negar aquilo que eu sinto, que eu penso, que eu intuo, e me submeter a esse joguinho porque tenho um monte de boletos bancários esperando para serem pagos. São valores impostos e que nem tem como serem discutidos, tais como os valores mínimos da conta de água para os estabelecimentos comerciais, os valores das assinaturas de telefone, os ICMS das contas de Luz - já viu isso, imposto de circulação de mercadorias para conta de luz! Tenho que mentir para conseguir um montinho daquele papel impresso numa gráfica qualquer para pagar aquele montinho de boletos, também impressos numa gráfica qualquer.

- Isso é uma coisa de louco, não é cara?... Neguinho comendo neguinho por causa de um montante de papel!

- O pior é que, na minha mão, esse papel chega e não fica nem por um dia, porque o mesmo não tem propriedade... É uma coisa corrompida; não dá nem tesão de pegá-lo nas mãos. Não é fruto de uma troca amorosa... É fruto de um joguinho hipócrita, que já vem corrompido em si mesmo. É um monte de papel sem substância real; de real, só mesmo o nome. Isso porque já é fruto de uma contrariedade. Não sei você, mas eu, todos os dias me levanto com aquela sensação de que acordei para me contrariar... É o dia todo tendo que me contrariar.

- Nem me fale! São todas atividades que são "contrarias ao meu ar", por isso que são de contrariar... São todas contrárias ao ar que me move. Mas, para eles lá fora, eu é que sou o problemático, o cara que não consegue sucesso... Será que para ter sucesso lá fora, terei que me conformar em me contrariar, em me submeter, em abandonar os meus valores internos em favor dos falsos valores externos? Pior cara, que a grande maioria que me critica pelas costas, são exatamente aqueles que há muito tempo já se venderam para o sistema. Aceitaram, trocar suas aspirações – se é que algum dia aspiraram algo – por aquilo que "dá mais dinheiro"... Tenho notado tudo isso! O que tem preenchido os meus dias tem sido a mesma pergunta: o que eu posso fazer para conseguir o mínimo necessário para a minha sobrevivência, de modo que eu não precise corromper ninguém e muito menos ser corrompido?

- É uma ótima pergunta, Celsão!

- Eu notei que em todo o lugar que eu corro, é como se fosse um labirinto, cara!... Vai por aqui... Não é!... Vai por ali... Também não é!...

- Eu não sei se isso acontece com você, mas comigo acontece muito que a grande maioria das coisas que me vêm na mão, são sempre problemáticas... A maioria das coisas que chegam para eu fazer, só de bater os olhos já vejo que vai dar enrrosco, que vai dar problema, confusão e desgaste desnecessário de energia...

- Nem me fale! Acontece direto comigo! É um saco, cara!... É um saco para você fechar a venda, é um saco para você poder entregar e um saco maior ainda para você conseguir receber... E depois, um saco maior ainda para receber da sua empresa! É muito nervoso, cara!... O problema é que a grande maioria só está preocupada com o ter, ninguém está preocupado com o ser, e com o ser que o outro é. Primeiro eu quero ter, e não me importo se para poder ter, eu tenha que passar por cima do seu ser. Cara, não consigo fazer esse jogo e mesmo que conseguisse, não tenho a mínima vontade de fazê-lo. O foda é ter que ficar aturando aquele olhar silencioso dos familiares...

- Já vivi isso na pele!

- Cara, o jogo é sempre o mesmo... O homem foi condicionado a ter para poder ter a mulher que ele quer ter, assinando um pacto para mantê-la. Ela assina o acordo e estamos conversados. Se você não tem, ela vai embora e faz você ter para ela, obrigado judicialmente... É ridículo ao que o homem se submete para poder jogar esse jogo!

- Eu vejo que os meios de comunicação vão programando as pessoas desde a mais tenra idade para esse processo do vir-a-ter e não do ser... É a corrente de ouro, é o relógio não sei da onde, é a faculdade no país tal, é a camisa, o carro, a casa, o diploma na parede, o celular, o peitox, o bundox, o siliconox e por ai vai... Ninguém quer ser um anônimo, todo mundo quer sair em Caras, mesmo que tenha que mostrar a bunda! Cara, está tudo aí, mas me parece que ninguém quer ver nada. Elas têm esse direito de não quererem ver nada, mas será que elas também tem o direito de me forçar a fechar meus olhos e participar de tudo isso?... Cara, as pessoas não olham para mim, mas sim, para a minha imagem, para o meu sapato, a minha calça, a minha camisa, para o modelo e ano do meu carro, o tipo do meu celular, o bairro que eu moro, a escola em que estudei... Pelo ser que eu sou, ninguém se interessa... Só há interesse se eu de alguma maneira for funcional para aquilo que elas estão buscando... Eu mesmo, sou totalmente descartável, mera peça do joguinho!

- Eheheh!

- Jr, me ajuda! Eu fico vendo isso e às vezes chego a pensar que estou ficando louco!... Cara, é sério! Eu estava vendo na revista qual é o livro que está sendo mais vendido nas livrarias... Sabe qual é?... The Secret!... Cara, isso é brincadeira! Esse filme é uma verdadeira falácia... É só atrás de dinheiro que as pessoas estão atrás... Os caras estão tão programados que não pescam nada, não percebem nada! Não conseguem ver o quanto estão sendo condicionados ao consumismo que lentamete os consome.

- É isso mesmo, Celsão!

- Eu vejo as coisas... Lá em casa mesmo! Você sabe bem a minha situação: não tenho grana para quase nada, somente o que é essencial. Quando eu chego em casa, sou tratado de uma forma diferente como é tratado o meu irmão que está, entre aspas, "estabilizado profissionalmente"... E não pense que isso é mania de perseguição de minha parte: isso é um fato! A coisa é sutil! Dá para perceber pela linguagem do corpo e pelo tom da voz!

- Uma pessoa condicionada a esse modo de ser, ao ouvir o que você está dizendo, logo rotularia você de "invejoso"...

- Eu, inveja daquele pobre coitado que passa o dia trancafiado dentro de um shopping, numa média diária de dez horas, fazendo exigência descabida de uma equipe de vendedores estressados e mal pagos?... Estou fora!... A coisa está tão corrompida aí fora, que é preciso tomar muito cuidado...

- Celsão, você precisa mesmo tomar muito cuidado com quem conversa sobre isso aí fora. Se você não estiver atento, eles vêm com aqueles chavões, com aqueles programinhas para você se adaptar a esse sistema de valores que desvalorizam o ser em nome do ter. Se você estiver desligado, se você não estiver com o seu campo de força ligado, as sentinelas que estão aí, tentando a todo custo invadir o seu cérebro, acabam entrando e fazendo um enorme estrago. Tem que ficar esperto se não, automaticamente se instala o conflito gerado pela comparação e, como você bem sabe, toda comparação faz parar a ação.

- Nem me fale, Jr! Outro dia mesmo eu vi isso... Estava indo com minha garota ao shopping; estávamos de metrô. Quando passei, a pé pelo estacionamento do shopping, o cabeção já começou a apitar...

- Imagino!

- Cadê seu carro? Um cara da sua idade sem carro? Cadê o celular? Cadê os cartões de crédito?... Daqui a pouco, nem mulher você vai ter mais!... É assim que a cabeça mente!

- O campo de força tem que estar ligado!

- Jr, onde é que estão os homens que pensam como nós?

- Acho que somos um tipo em extinção!

- Cara, eu não me conformo! As pessoas ficam incomodadas com o meu comportamento e acham que eu sou um cara problemático porque não compactuo do mesmo tipo de ambição delas... Algumas estão tão cegas que não percebem que também sou ambicioso, só que em outra área: ambiciono ser um cara totalmente livre! Elas ficam me cobrando que eu não tenho ambição, que eu não penso em progredir na vida, em ser um cara realizado materialmente falando... E eu olho para a vida dessas pessoas, que aos olhos do mundo são pessoas tidas como verdadeiros homens e mulheres de "sucesso", e não consigo ver beleza em seu olhar, em seu sorriso, não vejo nada de nutritivo nas palavras que pronunciam, nas coisas que buscam, nos ambientes que freqüentam... Só vejo um enorme vazio repleto de coisas vazias... Uma coleção de propriedades isentas de real propriedade!... E aí, quase no final de suas vidas vazias, as vejo correndo para ações filantrópicas, participando de "clubinhos espiritualistas", congressos esotéricos, "caminhos espiritualistas" e toda essa babaquice que só serve para ampliar ainda mais a mediocridade da vida dessas pessoas – se é que podemos chamar isso de vida!...

- Eles têm olhos de ver, mas não vêem!

- Eu ambiciono progredir não no externo, mas no interno: quero mais inteligência, sensibilidade, amorosidade, humanidade... Para essas pessoas, o progredir é sinal de matéria, de viagens pelo mundo a fora, menos a viagem mais importante que é a viagem para dentro de si mesmas. É casa, conta bancária gorda, carro do ano e de preferência importado, corpo sarado, tecnologia de ponta e por aí vai! E depois de tudo isso, vivem numa constante insegurança, com seus carros blindados, condomínios fechados, cercados de câmeras de segurança e cercas eletrificadas, carros monitorados, chips nos dentes, apólices e mais apólices de seguros, porte de armas, segurança particular... Continuam prisioneiras de seus medos, só que agora, de medos mais caros!

- Eles não percebem que, aquilo que eles chamam de sucesso é a progressão homeopática de um sistema de campo de concentração: são prisioneiros de suas posses e de seus status! Perdem a liberdade das coisas simples da vida!

- Que loucura, Jr!

- Eles pensam que pessoas como nós, não ganham dinheiro por que não queremos! Nesta semana estive numa firma fazendo um serviço de computação gráfica. Em determinado momento, um dos donos me falou: cara, você com um talento desses e se permite ficar embaixo daquela árvore filosofando ao invés de ganhar muito dinheiro com isso?... Ninguém me perguntou o porquê de eu não querer viver louco atrás de dinheiro como eles pensam ser necessário... A visão deles é a de que eu não ganho dinheiro por que não quero, por que sou vagabundo... "Mas você tem um enorme talento, por que você não faz uso disso?"... A minha vontade é falar que eu não faço uso disso por que cansei de ter que ficar ligando para as pessoas e ouvir o mesmo tipo de resposta ensaiada pela secretária de que o dono não está, de que saiu para uma reunião, de que teve que ir levar a esposa ao médico e por aí vai. Que não faço uso disso por que cansei de ter que ficar mentindo para vender meu trabalho, de fingir que acredito nas historinhas que me contam para atrasar o pagamento do serviço e por ai vai! Por que cansei de ter que vender meu trabalho por um preço muito abaixo do que realmente vale por que pessoas como você fazem joguete com as pessoas"... Esse é o tipo de resposta que tenho a vontade que dar, mas, se o faço, perco a oportunidade do serviço e, então, sou obrigado a jogar o jogo.

- Pior é que é assim mesmo que as coisas funcionam! É muito perca de energia por um preço tão limitado!

- Mas a questão é que nos deparamos com os fatos que se apresentam agora!... Como ganhar nosso sustento, com contento e sem a corrupção dos nossos valores mais caros?

- Como eu gostaria de ter a resposta para essa pergunta, Jr; você não faz idéia de como isso me gera conflito! O pior, é que o preço das coisas aumentava cada vez mais e isso faz com que os valores necessários sejam cada vez maiores... E ninguém faz nada! Todos vão correndo feito macacos amestrados! Não é só o macaco que bate palmas em troca de uma banana: o ser humano também!

- E todo mundo vai, Celsão!... É uma verdadeira comédia!

- Cara, eu não consigo me adaptar a esse mundinho hipócrita dos negócios... Almoço com talão de pedido do lado, academia com talão de pedido do lado. Ninguém está nem aí pra você, mas sim, para o pedido que podem tirar em cima de você. Você não vale pelo que é, mas sim, pela assinatura no pedido. Você é algo totalmente descartável. Almoço cujo assunto é negócios, para mim, não dá.

- Pois é!

- Você quer deixar um cara desses embaraçado? Faz o seguinte: olhe bem no fundo dos olhos dele e pergunte se ele tem algum amigo de verdade... Sim, alguém com quem ele possa pensar alto, que possa dizer aquilo que ele realmente é, aquilo que ele realmente sente, sem ter que fazer uso de máscaras ou medir palavras, alguém com quem tenha real intimidade... De verdade!... Olhe bem a cara de bunda que o sujeito fica! Um cara desses não tem amigo, tem contatos! Um cara desses, para poder pensar alto, falar de suas intimidades, paga por um analista! Não quero isso para mim não, Jr! Prefiro que continuem pensando que eu sou um cara problemático, um cara utópico, um bobo! Eu prefiro que eles sejam os VIP's, eu prefiro ser um anônimo... Que loucura, cara! Os caras estão presos num circulo vicioso e não percebem. Transformam o cara num cliente Vip, com uma sala com ar condicionado e o cara se ilude que é mais importante que as demais pessoas, que é um homem de sucesso... Para, meu! O cara não percebe que é mais um otário do sistema, por que para bancar aquilo... Sabe-se lá!

- É a história do gatinho... Conhece?

- Não!

- Tinha um cara que vivia pescando, até que um mui amigo lhe deu um gato. Foi quando ele percebeu que o gato precisava de leite, então ele decidiu comprar uma vaquinha. Quando ele comprou a vaquinha, percebeu que precisava construir uma cerca. Para colocar a cerca, contratou dois funcionários. Depois que cercou o terreno, percebeu que precisava construir um galpão para proteger a vaca do tempo ruim. Ai, o amigo que deu o peixinho pra ele, sugeriu que ele começasse a criar vaquinhas para vender leite na cidade, já que ele tinha o terreno cercado e o galpão construído. Quando ele despertou, estava com mais de 100 cabeças de gado, uma média de 20 funcionários e sem o tempo livre para poder pescar e comer um peixinho fresco... É Jr, aceita o gatinho do cartão de crédito, do cheque especial e do cliente Vip... Vai lá!

- Estou fora! Quero curtir o simples! Quero muito mais do que esperar pela aposentadoria para poder curtir a vida sem sentido, quero curtir a vida agora! E por falar em agora, já estou indo! Valeu pela prosa! Estava mesmo precisando de um par de ouvidos fraternos! Ainda bem que você não tem secretária e nem funcionários, senão, com certeza, teria que consultar sua agenda para poder falar com você!

- É cara, a coisa funciona desse jeito mesmo! E nós é que somos loucos!

- Santa loucura, meu irmão, santa loucura!

- Cuide-se bem!

02 agosto 2007

Matrix: o campo de concentração do nosso século

- Fala Celsão!

- E aí JR? Belê?

- Na boa! Só observando! Que conta de novo!

- Esse final de semana estive uma sacada e tanto... Estava assistindo um filme sobre a segunda guerra mundial quando me ocorreu um pensamento: todos nós vivemos numa espécie de campo de concentração... Um campo de concentração intensivo. Faz sentido para você?

- A Matrix, que simboliza a rede do pensamento condicionado é o "campo de concentração". Por isso estamos presos.

- Está todo mundo preso, JR. Mesmo a gente querendo sair, eles nos influenciam e nos mantêm presos.

- Você assistiu Matrix?

- Claro!

- Lembra-se daquela cena em que o Neo está caminhando com o Morfeu, dentro da Matrix, quando, no meio das várias pessoas vestidas de preto, surge uma mulher de vestido vermelho?

- Lembro sim!

- Então, o Morfeu diz que quando estamos dentro da Matrix, o que vemos são carpinteiros, engenheiros e outros mais. Todas essas pessoas que você está querendo salvar eles ainda são um inimigo em potencial. Todos eles podem lhe matar, ou seja, lhe manter preso dentro desse imenso campo de concentração que é a Matrix, ou seja, a rede do pensamento condicionado. Eles vão tentar te influenciar de algum modo para que você volte a "funcionar como um autômato" dentro da Matrix.

- Vejo isso acontecendo direto dentro da minha casa. Por vezes estou sentado no sofá da sala lendo um livro de filosofia, minha mãe passa por mim e solta as indiretas dela: isso é que é vida, parece um marajá... Quando é que você vai arrumar um emprego de verdade? Quando é que você vai pensar seriamente em arrumar um trabalho digno? Você precisa ganhar dinheiro!

- Pois é! Se você se identifica com esse tipo de influencia, um abraço: de volta para a Matrix. Isso realmente é um campo de concentração! Porque é um campo que concentra toda a sua ação na busca do consumismo e na prestação de contas. Sua ação fica só nessa esfera. Você precisa voltar a assistir o filme Matrix por essa ótica que estou lhe falando. Está tudo lá, nas entrelinhas. Neste final de semana estudei esse filme com um grupo de amigos evolutivos e foi de muito proveito.

- Imagino! Você é foda! Nunca me dá um toque desses estudos! Quando é assim, vê se me liga!

- Eu e um amigo meu estamos pensando em escrever sobre esse estudo do filme. Para nós está claro que a Matrix é uma metáfora para exemplificar a ação da Rede do Pensamento Condicionado. A gente é constantemente bombardeado... Basta sentar um pouco para meditar que a mente já começa com as comparações, ou insinuar que você deveria estar se ocupando com outras coisas mais importantes. Você sabe muito bem como funciona isso! Ela não te deixa ir atrás do que é essencial; isso está muito claro para mim!

- Precisamos marcar para estudar esse filme juntos.

- Basta querer! É muita informação! O filme inteiro tem muita coisa em comum com as idéias de Krishnamurti; não quero afirmar com isso que o filme tenha sido inspirado no pensamento dele. Existem várias visões espalhadas pela internet, esta é apenas mais uma. No entanto, para nós, satisfaz muito. Esse filme foi muito bem bolado, cena por cena, fala por fala... É tanta informação passada de forma tão rápida que por vezes, passa sem perceber. Por isso que é legal sentar em grupo para estudá-lo.

- No telefone você estava me falando que a nave "Nabucodonosor", seria a representação do cérebro, é isso?

- Sim! A nave seria o cérebro humano, e a sua tripulação seria a intuição, o observador, o pensamento técnico, o boicotador, os opostos. Os sentinelas que tentam invadir a nave são os pensamentos do coletivo que estão sempre prontos, esperando por um vacilo seu para que possam atacar e dominar sua mente. Os sentinelas querem entrar na sua mente de forma violenta... Os sentinelas são as "iscas sociais e parentais"...

- E se marcar entra mesmo, não é JR!

- Se você não tiver um "campo de força", entra mesmo! Lembra-se do campo de força que mostra no filme? "Pois é meu caro, pois é"! Esse campo de força é a sua observação! Sem a observação você é um elemento extremamente vulnerável.

- Entra mesmo!

- Mesmo já tendo desenvolvido esse observador interno, mesmo esse observador ainda é pensamento! É por isso que ele corre o risco de ser pego pelos sentinelas da Matrix.

- Interessante que no final do filme o Neo morre...

- Nada disso: quem morrer é o Anderson – a representação do nosso lado condicionado, e, portanto, isento de inteligência, inocência e energia criativa. Ele precisa morrer para que o nosso lado Neo possa ter vida em abundância. O Anderson precisa nascer.

- E os agentes Smiths?

- São a representação da natureza do pensamento coletivo... São todas as manifestações de pensamentos e emoções doentias como o medo, raiva, cólera, inveja, ciúmes, prepotência, covardia... As balas representam esses sentimentos, esses pensamentos que roubam uma energia imensa do ser humano...Enquanto Anderson, era preciso gastar muita munição, muita energia, era preciso correr, buscar por mecanismos de fugas, dependências externas para poder fugir do ataque dos pensamentos... Quando o Anderson morre, que é nosso lado condicionado, ele tem uma experiência direta dessa inteligência amorosa, que é toda energia, que se manifesta da fusão entre observador, coisa observada e intuição... Ali nasce o Neo, o novo, aquele que já não é mais corrompido pela ação do pensamento.

- Faz sentido! Nessa cena os pensamentos tentam atacá-lo, mas não tem mais força contra ele.

- As balas nem chegam mais até ele... O que são as balas? Todas as formas de "influências externas"... Já não tem mais o poder de atingi-lo... Ali é a representação que, quando descondicionado, você enxergar com propriedade todo o movimento da Matrix, do pensamento coletivo e, por enxergar, já não é mais influenciado por eles.

- Duca em JR?

- Ali, Neo, ao invés de fugir dos pensamentos, ao contrário, ele o ataca bem no seu centro... Quando ele entra no centro do pensamento, o que ocorre?

- Ele arrebenta com o pensamento e se ilumina todo! Sai um monte de luz! E os demais pensamentos saem correndo!

- Ali é a representação de que os pensamentos deixam de governar a vida do ser humano para serem apenas servidores de confiança de uma inteligência amorosa. Neo, passa a ser um canal de manifestação dessa energia amorosa criativa, capaz de ver a ação do falso, a influência, o condicionamento, sem se identificar com o que vê. O filme todo mostra os vacilos que damos, os medos de estarmos ficando loucos enquanto no processo... Preste bastante atenção nas expressões do Anderson durante o processo de descondicionamento. Ele tem dúvidas o tempo todo e só no final é que ele deixa de lado a "imagem" que ele tinha de si mesmo e se vê como realmente é. Só então ele tem condições de não mais ser influenciado pela rede do pensamento condicionado.

- É mesmo!

- Só ali ele aceita que ele é o Neo. O agente Smith queria sempre condicioná-lo de que ele era o Sr. Anderson, lembra-se?

- Sim! Em outras palavras, ele queria dizer que ele era um cara condicionado, sem poderes para alcançar a excelência do ser.

- O interessante são as cenas em que eles enfatizam a quantidade de munição que é preciso ser gasta para enfrentar os ataques do pensamento condicionado; quanto de conflito, de intriga e destruição que ocorre entre esse conflito de opostos.

- Sem essa visão, o filme passa a ser apenas um "filminho de violência".

- Pois é, Celsão! Pior é que a maioria não viu nada disso!

- E o Cypher, JR?

- Cypher é a representação das pessoas que entram no processo, mas que estão sempre de espreita, fazendo intrigas entre as pessoas que estão no processo, jogando uma contra outra, fazendo uma fofoca aqui, outra ali, fingindo ser uma coisa na sua frente e agindo completamente diferente quando longe de você. São pessoas dúbias, de comportamento duplo. São essas pessoas que entraram na caminhada, mas que não conseguem lidar com o que é, com os desafios constantes que se apresentam e que optam pela zona de conforto, da respeitabilidade, do prestigio e do prazer e começam a fazer parte novamente do sistema. Elas dizem que querem acordar, mas na realidade, o querem é dormir. Essas pessoas passam a ser "informantes" da Matrix. Cypher é a representação desse nosso lado de auto-boicote. Conhece alguém assim?

- Tá lotado, JR! Rá Lotado! Trairagem é que não falta!

- Cypher é a representação dessas pessoas que preferem se conformar com essa vidinha socialmente aceita, que está dentro do script do padrão condicionado pelo social, pelo pensamento coletivo.

- Lembro-me de uma fala do Cypher em que ele dizia que não queria se lembrar de nada, que ele queria voltar e ser um home de sucesso!

- Ele diz que não quer lembrar-se de nada por quê? Porque ele já tem a informação interna e aí fica difícil "servir a dois senhores". Fica difícil viver na Matrix tendo toda essa informação!

- Não tem como, JR!

- Esse filme mostra o tempo todo a falsidade da imagem, da palavra, do tempo... Há uma fala do Morfeu em que ele diz para o Neo que o tempo é o nosso maior inimigo. Esse tempo é o tempo psicológico, talvez o maior inimigo do ser humano. Você se lembra do diálogo em que eles estão se alimentando na nave e o menino começa a dizer que aquela gosma poderia ser um monte de coisa? Que ele pergunta sobre quem é que disse que o gosto do frango é do frango mesmo?

- Sim, o que significa?

- Que a palavra não é a coisa!

- É mesmo! Krishnamurti na veia!

- Pois é! Já estamos colocando os nossos estudos no site da Cuidar do Ser. A idéia é colocar o estudo do filme inteiro. Já estamos com oito capítulos no site.

- Dez! Cara, vou voltar aqui para a gente estudar esse filme junto! Agora, como sempre, vou correr atrás de uns "courinhos de rato" para pagar a papelada lá de casa. Vou sair por ai contando umas mentirinhas básicas para ver se vendo alguma coisa... É foda!

- Pega leve! Continua firme no processo que a qualquer momento sua "expressão de vida" se manifesta! Por enquanto, o lance é ir "sobrevivendo".

- Pois é cara, é assim mesmo que eu me sinto: tentando "sobreviver" neste imenso campo de concentração chamado "capitalismo". Este mata mais que os porões da morte de Auschwitz-Birkenau ou Dachau.

- Me identifico com você! Sobreviventes meu caro, sobreviventes!...


 


 


 

Gostou? Então compartilhe!

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!